terça-feira, 22 de janeiro de 2019

ARREMATAÇÃO DE DIREITO REAL DE AQUISIÇÃO EM LEILÃO PÚBLICO

Em junho de 2017, no XLIV Encontro dos Oficiais de Registro de Imóveis do Brasil, realizado em Curitiba (PR) defendi que, embora crescente o interesse de terceiros – principalmente os condomínios edilícios – na expropriação judicial do Direito Real de Aquisição, de que trata o art. 1368-B do Código Civil, para posterior alienação e satisfação de quotas e obrigações não cumpridas, as consequências – patrimoniais, civis e registrais – da penhora e alienação forçada desse direito real não eram inteiramente conhecidas e careciam de ser esclarecidas.

Minha exposição tinha a pretensão de discordar dos advogados, juízes e especialistas em alienação fiduciária de bem imóvel em garantia - bem como de boa parte dos Oficiais de Registros - que, naquele momento, entendiam (e ainda entendem) que o arrematante desse direito em leilão público assume, automaticamente, a posição que o devedor possuía no contrato principal, na condição de fiduciante e com a obrigação de honrar o saldo da dívida.

Para tanto, sustentei que:
"Parece claro que a penhora abrange o conteúdo jurídico e econômico do direito real de aquisição, mas não alcança e nem inclui a posse direta do imóvel e tampouco promove qualquer alteração nos negócios jurídicos antecedentes e vigentes, restando o arrematante titular de direitos que poderão ser exercidos no tempo e nas condições contratuais e legais.

Dessa forma, a assunção do débito e a consequente substituição do devedor fiduciante pelo arrematante somente ocorrerá se, e quando, o credor fiduciário concordar e dependerá, também, da anuência do próprio fiduciante – cedente das obrigações – que, apesar da constrição de direitos, não estará obrigado a ceder sua posição contratual.

[...]

Portanto, sua eventual arrematação insere um terceiro interessado na relação jurídica, de forma que:

(a) O credor fiduciário continua titular de seus créditos e da propriedade fiduciária do imóvel;
(b) O devedor fiduciante permanece obrigado a realizar a liquidação dos débitos contratados e, no caso de venda forçada, a ele será destinado o valor que sobejar aos créditos do fiduciário e do arrematante;
(c) Ao arrematante, a aquisição dos direitos reais de aquisição implicará – apenas e tão somente – na transmissão da titularidade de direitos, que somente poderão ser realizados quando da liquidação da dívida ou naquilo que sobejar à dívida em eventual venda do imóvel em leilão."
Foi com prazer que verifiquei - no Diário da Justiça de 17 de janeiro de 2019 - a publicação do extrato de sentença abaixo transcrito que reconhece e aplica a tese jurídica ali exposta, cuja íntegra poderá ser lida na referida Revista de Direito Imobiliário do IRIB - Edição 84, 2018.
Data de Publicação:17/01/2019
Jornal: Diário da Justiça do Estado de SÃO PAULO
Página: 00168
Local: DJSP - CADERNO 3 JUDICIAL 1ª INSTÂNCIA CAPITAL. Fóruns Centrais. Fórum João Mendes Júnior
Vara: 10ª Vara Cível

Processo 1072435-19.2018.8.26.0100 - Execução de Titulo Extrajudicial - Condomínio em Edifício - Condomínio Absoluto - Vistos. Fl. 74: Indefiro o requerimento. O negocio fiduciário transmite a propriedade para o fiduciário ate que haja o adimplemento da obrigação estabelecida pelas partes, o que impede qualquer constrição do direito real de propriedade. Caso deseje o exequente a penhora do direito real de aquisição da propriedade plena (artigo 1.368-B da lei 10.406/02), devera providenciar a intimação do credor fiduciário, nos termos do artigo 799, inciso I da lei 13.105/15. Ademais fica desde já o exequente cientificado de que a divida garantida (R$ 370.400,00), resultou no debito de R$ 1.553.281,20, sendo certo que na fase de expropriação-satisfação, o Juízo se pronunciara a respeito das informações necessárias a publicização do ato expropriatório, para que terceiros que venham a dar lances não se tornem prejudicados. Isso pelo fato de que a alienação fiduciária não se confunde com o penhor e a hipoteca, que são garantias reais em coisa alheia, sendo aquela garantia real em coisa própria. Desse modo, entendo tal como o jurista MAURO ANTONIO ROCHA que o terceiro se insere na relação jurídica: "A) credor fiduciário continua a ser titular de seus créditos e da propriedade resolúvel; B) devedor ainda fiduciante - permanece obrigado a realizar a liquidação dos débitos contratados e, no caso de venda forcada, a ele sera destinado o valor que sobejar aos créditos do fiduciário e do arrematante; C) arrematante, a aquisição dos direitos reais de aquisição implicara - apenas e tao somente - na transmissão da titularidade de direitos, que somente poderão ser realizados quando da liquidação da divida ou naquilo que sobejar a divida em eventual venda do imóvel em leilão" (Revista de Direito Imobiliário do IRIB - Edição 84)." Trata-se de uma aquisição de risco sobre a qual, oportunamente, apos a manifestação do exequente, que devera ocorrer em 10 dias, manifestar-me-ei. Intime-se. - ADV: SEBASTIÃO ANTONIO DE CARVALHO (OAB 101857/SP), JOSE ANTONIO FERRARONI GONCALVES GOMES (OAB 87367/SP)

É de fundamental importância que o credor exequente esteja ciente de que a penhora de direito real de aquisição alcança exclusivamente o valor financeiro teórico daquele bem patrimonial e - principalmente - que o o eventual arrematante seja alertado que a arrematação desvinculada da sub-rogação de débitos ou créditos proporcionará apenas a titularidade de direito de valor indeterminado, cujo exercício se fará quando da liquidação da dívida, pela via normal – em concorrência com o fiduciante – ou pela execução extrajudicial no caso de inadimplência que justifique a consolidação da propriedade, limitado ao valor que sobejar a dívida.

sexta-feira, 21 de dezembro de 2018

DESTAQUE 2018. Distratos no mercado imobiliário.

O Desembargador Francisco Loureiro, do Tribunal de Justiça de São Paulo concedeu entrevista ao Dr. Alexandre Gomide, do Blog do Direito Civil & Imobiliário, para tratar da nova lei dos distratos na aquisição de bens imóveis.


quinta-feira, 20 de dezembro de 2018

DESTAQUE 2018. Porque respeitar os marcos regulatórios do crédito imobiliário?

Conheça os principais marcos regulatórios do crédito imobiliário e por que é imprescindível respeitá-los e aperfeiçoá-los.
Teotonio Costa Rezende
Mestre em Gestão e Estratégia de Negócios


Para a maioria dos países, é inegável a relevância que as operações de crédito imobiliário têm, tanto em termos econômicos quanto em relação aos impactos sociais. Isso porque, dado o expressivo valor de um imóvel, poucos são aqueles que têm disponibilidade para adquiri-lo apenas com recursos próprios.

O crédito imobiliário exerce o importante papel de, numa ponta, fomentar a produção de imóveis e, assim, possibilitar a geração de emprego e renda via fortalecimento do setor da indústria da construção civil. E por outro, viabilizar o acesso das famílias a uma moradia digna.

Dessa forma, ao mesmo tempo em que gera impactos positivos na economia, o crédito imobiliário contribui para o desenvolvimento social por meio do combate ao déficit habitacional, tanto em termos quantitativos como em termos qualitativos.

No mundo capitalista, se a segurança jurídica é de extrema importância para o funcionamento de qualquer mercado, inclusive em operações de curtíssimo prazo, nas operações de longo prazo, caso do crédito imobiliário, referida segurança jurídica é absolutamente vital. A segurança jurídica no mercado de crédito imobiliário é representada pelo binômio segurança para conceder o crédito, ou seja, a certeza da validade e eficácia dos contratos e da segurança para recuperar o crédito, isto é, a certeza de exequibilidade das garantias reais no caso de inadimplência do devedor.

A instabilidade econômica da década de 1980 até meados da década de 1990, agravada pela elevação, em níveis insustentáveis, do risco jurídico advindo do paternalismo com que o Poder Judiciário tratou os devedores inadimplentes, associado à imprevisibilidade do desfecho dessas demandas judiciais, tanto em termos de conteúdo quanto de prazo de conclusão, acabou por tomar o crédito imobiliário ‘mau negócio’ para os bancos. E, por conseguinte, praticamente paralisou o mercado de crédito imobiliário por mais de uma década.

MARCOS REGULATÓRIOS DO CRÉDITO IMOBILIÁRIO

A estabilidade econômica vigente a partir do segundo semestre de 1994, conjugada com importantes avanços no marco regulatório, possibilitou a retomada do crédito imobiliário, principalmente a partir de 2004.
Para que se tenha uma ideia da dimensão da magnitude desse novo ciclo, vale destacar que no período 1970-1994 foram financiados, em média, 220 mil imóveis por ano, média essa que subiu para 550 mil imóveis por ano no período 1995-2015, com destaque para os três últimos anos desse período, quando se financiou quase 1 milhão de imóveis por ano.
É possível afirmar, com convicção, que a melhoria na segurança jurídica foi um dos motores de expansão do crédito imobiliário nesse novo ciclo.
Destacaremos, a seguir, os principais avanços verificados no marco regulatório do crédito imobiliário ao longo das duas últimas décadas, embora o objetivo principal deste artigo não seja falar propriamente desses avanços, mas da preocupação quanto a possíveis retrocessos decorrentes de decisões judiciais equivocadas, que podem fazer com que estes avanços percam a eficácia, com sérios danos para a economia e para a sociedade.

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quarta-feira, 19 de dezembro de 2018

DESTAQUE 2018: STJ confirma TR como índice para a correção do FGTS. Recurso repetitivo


A decisão da 1ª Turma do Superior Tribunal de Justiça manteve a TR como índice de atualização das contas do Fundo Garantia e definiu o tema como repetitivo, liberando milhares de ações que aguardam julgamento. O relator ministro Benedito Gonçalves, afirmou que o Tribunal não poderia alterar o que diz claramente a Lei 8.177/91, que adotou a TR como parâmetro para correção monetária dos depósitos do FGTS.


Processo REsp 1.614.874-SC, Rel. Min. Benedito Gonçalves, Primeira Seção, por unanimidade, julgado em 11/04/2018, DJe 15/05/2018 (Tema 731)
DESTAQUE

A remuneração das contas vinculadas ao FGTS tem disciplina própria, ditada por lei, que estabelece a TR como forma de atualização monetária, sendo vedado, portanto, ao Poder Judiciário substituir o mencionado índice.

INFORMAÇÕES DO INTEIRO TEOR

Discute-se a possibilidade, ou não, de a Taxa Referencial TR ser substituída como índice de correção monetária dos saldos das contas vinculadas ao Fundo de Garantia do Tempo de Serviço - FGTS por outro que melhor reponha as perdas decorrentes da inflação.
Inicialmente, observe-se que diferentemente das cadernetas de poupança, regidas por contrato, o FGTS não tem natureza contratual, na medida em que decorre de lei todo o seu disciplinamento, ostentando natureza estatutária. Portanto, é vedado ao Poder Judiciário substituir índice de correção monetária estabelecido em lei. Ainda devem ser realçadas questões de política econômica que pairam sobre a destinação do FGTS que, além de servir de indenização aos trabalhadores, possui a finalidade de fomentar políticas públicas.
Portanto, pode ser definido como um fundo de natureza financeira e que ostenta característica de multiplicidade. Esse caráter institucional do FGTS não gera o direito, aos fundistas, de eleger o índice de correção monetária que entendem ser mais vantajoso.
Por fim, tendo o legislador estipulado a TR como o índice legal de remuneração das contas vinculadas ao FGTS, não pode tal índice ser substituído por outro simplesmente sob a alegação da existência de outros índices que melhor repõem as perdas decorrentes do processo inflacionário, porque tal providência está claramente inserida no âmbito de atuação do Poder Legislativo, e a atuação do Poder Judiciário só estaria legitimada se houvesse vácuo legislativo ou inércia, sob pena de vulnerar o princípio da separação dos poderes.



Superior Tribunal de Justiça
Repetitivo. FGTS. Contas vinculadas. Atualização monetária. TR. Índice legal.


1 EMENTA OFICIAL PROCESSUAL CIVIL E ADMINISTRATIVO. RECURSO ESPECIAL REPRESENTATIVO DE CONTROVÉRSIA. TEMA 731. ARTIGO 1.036 DO CPC/2015. FUNDO DE GARANTIA DO TEMPO DE SERVIÇO -FGTS. SUBSTITUIÇÃO DA TAXA REFERENCIAL (TR) COMO FATOR DE CORREÇÃO MONETÁRIA DOS VALORES DEPOSITADOS POR ÍNDICE QUE MELHOR REPONHA AS PERDAS DECORRENTES DO PROCESSO INFLACIONÁRIO. IMPOSSIBILIDADE. FGTS QUE NÃO OSTENTA NATUREZA CONTRATUAL. REGRAMENTO ESTABELECIDO PELO ART. 17 DA LEI N. 8.177/1991 COMBINADO COM OS ARTS. 2º E 7º DA LEI N. 8.660/1993.

1. Para os fins de aplicação do artigo 1.036 do CPC/2015, é mister delimitar o âmbito da tese a ser sufragada neste recurso especial representativo de controvérsia: discute-se a possibilidade, ou não, de a TR ser substituída como índice de correção monetária dos saldos das contas vinculadas ao Fundo de Garantia do Tempo de Serviço - FGTS.
2. O recorrente assevera que “[...] a TR deixou de refletir, a partir de 1999, as taxas de inflação do mercado financeiro, e, por conseguinte, o FGTS também deixou de remunerar corretamente os depósitos vinculados a cada trabalhador” (fl. 507). Defende a aplicação do INPC ou IPCA ou, ainda, de outro índice que melhor reponha as perdas decorrentes da inflação.
3. Por seu turno, o recorrido alega que a lei obriga a aplicação da TR como fator de correção de monetária, na medida em que o FGTS não tem natureza contratual, tendo em vista que decorre de lei todo o seu disciplinamento, inclusive a correção monetária que lhe remunera.
4. A evolução legislativa respeitante às regras de correção monetária dos depósitos vinculados ao FGTS está delineada da seguinte forma:
(i) o art. 3º da Lei n. 5.107/1966 previra que a correção monetária das contas fundiárias respeitaria a legislação especifica;
(ii) posteriormente, a Lei n. 5.107/1966 foi alterada pelo Decreto-Lei n. 20/1966, e o art. 3º supra passou a prever que os depósitos estariam sujeitos à correção monetária na forma e pelos critérios adotados pelo Sistema Financeiro da Habitação e capitalizariam juros segundo o disposto no artigo 4º;
(iii) em 1989, foi editada a Lei n. 7.839, que passou a disciplinar o FGTS e previu, em seu art. 11, que a correção monetária observaria os parâmetros fixados para atualização dos saldos de depósitos de poupança;
(iv) a Lei n. 8.036/1990, ainda em vigor, dispõe, em seu art. 13, a correção monetária dos depósitos vinculados ao FGTS com parâmetro nos índices de atualização da caderneta de poupança;
(v) a Lei n. 8.177/1991 estabeleceu regras de desindexação da economia, vindo a estipular, em seu art. 17, que os saldos das contas do FGTS deveriam ser remunerados, e não mais corrigidos, pela taxa aplicável à remuneração básica da poupança; e
(vi) a partir da edição da Lei n. 8.660/1993, precisamente em seus arts. 2º e 7º, a Taxa Referencial.
5. O FGTS não tem natureza contratual, na medida em que decorre de lei todo o seu disciplinamento. Precedentes RE 248.188, Relator Ministro Ilmar Galvão, Tribunal Pleno, DJ 1/6/ 2001; e RE 226.855/RS, Relator Ministro Moreira Alves, Tribunal Pleno, DJ 13/10/2000.
6. É vedado ao Poder Judiciário substituir índice de correção monetária estabelecido em lei. Precedentes: RE 442634 AgR, Relator Ministro Gilmar Mendes, Segunda Turma, DJ 30/11/2007; e RE 200.844 AgR, Relator: Ministro Celso de Mello, Segunda Turma, DJ 16/08/2002.
7. O FGTS é fundo de natureza financeira e que ostenta característica de multiplicidade, pois, além de servir de indenização aos trabalhadores, possui a finalidade de fomentar políticas públicas, conforme dispõe o art. 6º da Lei 8.036/1990.

8. A remuneração das contas vinculadas ao FGTS tem disciplina própria, ditada por lei, que estabelece a TR como forma de atualização monetária, sendo vedado, portanto, ao Poder Judiciário substituir o mencionado índice.

9. Recurso especial não provido. Acórdão submetido à sistemática do artigo 1.036 do CPC/2015.


terça-feira, 18 de dezembro de 2018

DESTAQUE 2018. Palestra em Latin American Real Estate Society - LARES 2018

Participação na mesa de debates de LARES - Latin American Real Estate Society, Sessão Plenária 03 - Aspectos jurídicos imobiliários: Distratos, realizada em 28 de setembro de 2018, no SECOVI (Milenium Centro de Convenções), juntamente com os palestrantes Dora Szwarc Hamaoui (Diretora Executiva do banco BTG Pactual), Dr. Ricardo Negrão (Sócio Diretor de NFA Advogados), Luiz França (CEO da ABRAINC), tendo como moderadora a Profa. Dra. Eliane Monetti (Escola Politécnica).


quarta-feira, 12 de dezembro de 2018

DESTAQUE 2018. Responsabilidade pelo pagamento da taxa condominial na alienação fiduciária

Em entrevista concedida pelo Desembargador Francisco Loureiro, do Tribunal de Justiça de São Paulo ao Dr. Alexandre Gomide, do Blog do Direito Civil & Imobiliário, o magistrado - um dos mais renomados juristas e conhecedores do Direito Imobiliário - tratou da controversa questão da responsabilidade pelo pagamento da taxa condominial em imóveis alienados fiduciariamente.


sexta-feira, 2 de novembro de 2018

XX Congresso Brasileiro de Direito Notarial e de Registro - ANOREG BR


Recebi o honroso convite para participar do XX Congresso Brasileiro de Direito Notarial e de Registro, promovido pela Associação dos Notários e Registradores do Brasil - Anoreg-BR e Associação dos Notários e Registradores do Estado de São Paulo - Anoreg-SP, nos dias 12 a 14 de novembro de 2018, no Hotel Tivoli Mofarrej, na cidade de São Paulo.

Convite aceito, estarei presente, aproveitando a oportunidade de compartilhar informações e aproximações, trocar experiências com os demais participantes e focado - principalmente - no aprendizado e aprofundamento do tema principal "Inteligência artificial - A era da tecnologia nos cartórios brasileiros".

segunda-feira, 1 de outubro de 2018

Conferência Internacional da Latin American Real State Society - LARES/2018

Transcrição da palestra sobre "Aspectos jurídicos imobiliários: DISTRATOS proferida pelo Dr. Mauro Antônio Rocha na Sessão Plenária 3 da Conferência Internacional da Latin American Real State Society - LARES/2018, no Auditório Millenium, na sede do SECOVI (SP), no dia 28/09 p.p.

Bom dia a todos.
Cumprimento aos integrantes desta mesa.

1. A questão da resolução dos contratos de aquisição de unidade imobiliária é monitorada pelos setores jurídicos da CAIXA ECONÔMICA FEDERAL desde o final do ano de 2013, com um tanto de preocupação e muita atenção, através da participação em grupos de estudos e mesas de debates, bem como do acompanhamento das proposições legais provindas dos Poderes Legislativo e Executivo, assim como das entidades representativas das incorporadoras, construtoras, dos adquirentes e consumidores. É fato que algum nível de desistência de adquirentes de unidades imobiliárias em construção – ainda que firmados sob cláusulas de irretratabilidade e irrevogabilidade - sempre existiu e pode ser considerada normal, face às características de um contrato de médio prazo e desembolsos constantes e pode ser admitido e acomodado pelas incorporadoras e construtoras, bem como pelo Poder Judiciário, desde que contida em percentual ou montante não prejudicial à consecução dos empreendimentos. Ainda assim, já naqueles momentos, o desfazimento do negócio não se mostrava amigável e consensual com relação à devolução dos valores pagos pelos adquirentes durante a vigência contratual.

2. Evidentemente, não se pode comparar a situação descrita, de desistência esperada e controlada, com a situação enfrentada a partir do primeiro semestre de 2014, em que a pretensão de resolução contratual manifestada pelos adquirentes disparou percentualmente, atingindo níveis absurdamente altos, tendo chegado quase à metade dos contratos firmados. A partir de então – para além da ausência de motivação aceitável e de se mostrar fundada exclusivamente no desencanto dos adquirentes com relação à perspectiva de lucro imaginada quando da contratação – essa despropositada demanda passou a ser acompanhada da exigência de devolução integral – imediata e atualizada – dos pagamentos efetuados, obrigando as sociedades credoras a repelir a possibilidade de resolução amigável e a impelir os descontentes à busca de solução judicial das demandas.

3. Dessa forma, a disputa foi direcionada ao Poder Judiciário nos mesmos termos em que estava sendo travada anteriormente – isto é, com vistas APENAS à determinação do quantum de retenção possível pelas incorporadoras e de prazo razoável para a devolução dos valores, resultando em decisões heterogêneas e disparatadas que fixaram retenções que oscilavam entre 5% a 30% e ordenaram reembolsos à vista, em prazos limitados ou, em alguns casos, no mesmo número de parcelas do recebimento. Parece ter faltado – e não vai aqui nenhuma crítica aos colegas que trabalharam nessas ações – a elaboração de uma tese jurídica, fundada na responsabilidade civil objetiva, que vinculasse os adquirentes de forma mais consistente ao próprio projeto de negócio.

4. De fato, a aquisição de uma unidade imobiliária em empreendimento em construção não pode ser resumida a um mero contrato de venda e compra. O adquirente, nestas condições, adere, de forma irrevogável e irretratável, a um negócio de interesse coletivo cuja consecução não poderá prescindir das contribuições financeiras contratadas. Sua desistência, portanto, implicará na impossibilidade de conclusão do empreendimento, no atraso do cronograma de obras, ou, no mínimo, na necessidade de esforços redobrados dos demais participantes e resultará, em qualquer desses casos, em perdas e danos, pelas quais deveria responder o adquirente desistente. Mal comparando – e já me desculpando pela comparação – é como se um pai desistisse da paternidade durante a gestação da criança. É evidente que – dotado de livre arbítrio – ele poderá abandonar os planos de casamento, de constituição de família etc., mas a gestação prosseguirá, independentemente de sua vontade, assim como suas responsabilidades com relação à criança e delas o pai desistente haverá de dar conta, espontaneamente ou por força de determinação judicial.

5. Porém, ainda que o momento mais tenso já tenha passado, há um enorme estoque de ações em andamento, aguardando sentença e faz-se necessário regrar essa situação para que não mais se repita a crise dos “distratos”. Para tanto, vários projetos de lei se destacam pela fase adiantada de avaliação no Congresso Nacional, como se destaca também o chamado “Pacto Global” firmado no Rio de Janeiro, mas ainda não aprovado pelas entidades representativas interessadas. Nenhum deles parece, no entanto, resolver de forma institucional e definitiva a questão discutida. São pálidos ao sugerir que o retorno do imóvel ao estoque do incorporador seja suficiente ao equilíbrio das contas, desconsiderando que a negociação desse imóvel exigirá novos esforços de divulgação, venda e contratação, não sendo lícito pretender a compensação de eventual lucro obtido nesse novo negócio com os resultados decorrentes da transação originária.

6. Para tanto, é preciso que se negociem normas que estabeleçam o justo equilíbrio entre o direito e a necessidade do adquirente a desistir do negócio jurídico e a recuperar parte dos valores pagos, MAS que reconheçam o direito do incorporador a (i) impor penalizações ao comprador que adere à incorporação, inclusive com a retenção da parte dos valores pagos correspondentes às despesas não recuperáveis e aos prejuízos causados pela desistência; (II) que permita que a devolução do devido se efetue em prazos compatíveis com o fluxo de caixa do empreendimento e (III) que também reconheça que a pretensão de lucro do incorporador integra o contrato originário e não pode ser desprezada, reduzida ou substituída por eventual resultado positivo obtido em novo negócio ajustado para a alienação do imóvel retornado.

É o que tinha a dizer, agradeço a atenção.

Obrigado.