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terça-feira, 7 de outubro de 2008

Os efeitos não-intencionais das hipotecas de 105%

O que significam hipotecas de 105% é que bancos insensatos emprestaram a pessoas insensatas (a juros muito baixos, feitos para ser "atraentes"), não apenas todo o capital para a compra de uma casa ou um apartamento, sem que o comprador fizesse pagamento inicial algum, mas também 5% extra - para pagar uma reforma da cozinha, por exemplo. As hipotecas de alto risco "subprime" nos Estados Unidos tinham sido financiadas alegremente por bancos suíços e construtoras de North Yorkshire normalmente austeros. Também tinham sido financiadas indiretamente (mas o que significa "indiretamente" hoje em dia?) por empresas de investimentos norueguesas e chinesas. E o resultado físico era mais do que evidente; ele pode ser visto agora nas fotos de centenas de "McMansões" parcialmente construídas invadindo os campos de cactos do Arizona.
E agora tudo desabou. O chamado "efeito marola" está se propagando para muito mais longe, e, à medida que essas ondas avançam, elas estão fazendo muitas vítimas e infligindo muitos danos. E não há dúvida de que esse vendaval está derrubando muitas árvores; e há muitas outras que ainda vão cair, revelando sua podridão interna. Algumas das baixas têm estado em todas as manchetes: Bear Stearns, Northern Rock, Lehman Brothers, Washington Mutual, o Halifax Bank of Scotland. Outras, como Morgan Stanley e Goldman Sachs, se converteram em criaturas financeiras de tipo diferente para poderem sobreviver.
É improvável que esse jogo de "mortos e urubus" vá parar em pouco tempo, já que muitos outros bancos de dimensões médias estão equilibrados à beira do abismo.
À medida que a chamada economia global se contrai, muitas das empresas que formam suas bases vão sentir os efeitos dolorosos disso. Em última análise, então, o maior perdedor pode muito bem ser os próprios Estados Unidos, e não me refiro unicamente aos padrões de vida de dezenas de milhões de seus cidadãos, mas à sua influência militar-estratégico-diplomática nos assuntos mundiais. Se o status de grande potência de um país se fundamenta essencialmente em seu poder econômico e financeiro, então a crise atual dos mercados de crédito não pode deixar de ser prejudicial aos EUA.
E uma parte tão grande disso tudo tem a ver com aquelas hipotecas de 105% e com a arrogância, a cobiça e a insensatez daqueles que as concederam, dos que as contraíram e dos Legislativos que revogaram a supervisão fiscal prudente. Neste nosso mundo globalizado e interligado, nenhum homem (ou mulher) é uma ilha. Assim, nas palavras imortais de John Donne, "nunca pergunte por quem os sinos dobram. Eles dobram por ti".
(Leia o texto completo na Folha de S. Paulo, Caderno Dinheiro, 7.10.2008)
Paul Kennedy, da Tribune Media Services, ocupa a cadeira J. Richardson de História e é diretor de Estudos de Segurança Internacional na Universidade Yale. É autor de "Ascensão e Queda das Grandes Potências". Tradução de Clara Allain