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sexta-feira, 28 de outubro de 2011

FGTS, 45 anos de resistência.

Até a criação do Fundo de Garantia do Tempo de Serviço, os direitos trabalhistas indenizatórios estavam previstos na Consolidação das Leis do Trabalho – a indenização por tempo de serviço nos artigos 477 a 487 e a estabilidade nos artigos 492 a 500. Cumpre ressaltar que, apesar do intenso aproveitamento político da CLT pelo governo populista de Getúlio Vargas e seus seguidores, a maioria dos direitos trabalhistas são preexistentes à sua aprovação pelo Decreto-Lei nº 5452/43. Assim é que o direito à estabilidade, ainda que em forma de privilégio e vinculado à matéria previdenciária, pode ser encontrado nas constituições de 1824 e 1891 e na legislação ordinária, beneficiando os trabalhadores ferroviários, já a partir de 1923 e a indenização do tempo de serviço já constava dos textos preliminares da Constituição de 1934 e surgiu, expressamente, no artigo 137, f, da Constituição de 1937.
O golpe militar de 1964 encerrou a etapa populista que se perpetuava desde o Estado Novo e as renovadas elites empresariais nacionais, aliadas aos representantes do capital estrangeiro que aqui chegavam para instalar ou adquirir unidades industriais e empresas nacionais existentes, conseguiram incluir entre os objetivos econômicos para o biênio 1964/66, a adoção de um sistema de seguro desemprego, destinado a substituir o direito à estabilidade, sob a justificativa de que “apenas 15% dos empregados eram estáveis, nos 30 anos de funcionamento do sistema (de estabilidade)” e que nas empresas com menos de 15 anos, a porcentagem de estáveis não passava de 1%.
Para desenvolver o sistema de seguro desemprego foi criado um grupo de trabalho – formado por técnicos dos ministérios do Trabalho e do Planejamento, aos quais se juntaram técnicos do recém criado BNH, do IBGE e do Instituto de Resseguros do Brasil – que vislumbrou a possibilidade da obtenção dos recursos necessários à execução do Programa Habitacional, mediante o recolhimento mensal centralizado, antecipado e obrigatório dos direitos indenizatórios – até então entesourados nas empresas.
O sistema apresentado foi criticado e repudiado por lideranças trabalhadoras – por prejudicial aos interesses do trabalhador e gerador de desemprego, por juristas – que vislumbraram inconstitucionalidade frente ao inciso XII do art. 157 da Constituição, mas, também, por setores empresariais descontentes com a antecipação dos desembolsos indenizatórios. Porém, como a rede sindical havia sido desarticulada pelo regime militar e a oposição política era mantida sob rígido controle, o projeto de lei foi enviado para aprovação do Congresso Nacional em trinta dias, prazo que não foi observado – resultando na sua conversão em lei por ato de força excepcional do Poder Executivo autorizado pelo Ato Institucional nº 2.
Portanto, o FGTS foi imposto aos empresários e aos trabalhadores através de ato de força, pelo regime oriundo do golpe militar. A versão folclórica que atribui sua criação à dificuldade do Estado em vender os ativos da Fábrica Nacional de Motores deve ser compreendida em contraponto à necessidade política de imunidade quanto às conseqüências eleitorais dos atos de gestão praticados.
Com a criação do Fundo de Garantia do Tempo de Serviço os trabalhadores já empregados puderam optar pelo novo regime ou pela manutenção do regime da estabilidade. No entanto, a partir de então, novos contratos de trabalho somente seriam firmados mediante a obrigatória adesão espontânea ao regime do fundo. Os dois regimes coexistiram até a promulgação da Constituição Federal atual que, no art. 7º, III, incluiu o FGTS no rol dos Direitos Sociais, tornando-o o único regime trabalhista indenizatório no País.
Avaliar, 45 anos passados, se a imposição do FGTS em detrimento do direito à estabilidade de emprego foi prejudicial aos trabalhadores é tarefa impossível e, em certa medida, irrelevante porque o instituto substituído dificilmente teria lugar no estágio atual das relações capital – trabalho. É possível, entretanto, mensurar o benefício auferido com a manutenção do Fundo, bastando mencionar os R$ 250 bilhões em ativos acumulados e ressaltar que milhões de trabalhadores tiveram acesso imediato aos seus direitos indenizatórios decorrentes da demissão ou da aposentadoria, além de outros milhões de famílias que se valeram desses recursos para adquirir moradia ou para o atendimento de necessidades em razão do falecimento ou doença grave dos trabalhadores.
Por tudo isso, no momento em que o mercado financeiro pressiona o Banco Central a elevar para R$ 750 mil o limite de avaliação dos imóveis passíveis de utilização do dinheiro do Fundo, em que políticos oportunistas apresentam mais de 500 projetos de lei destinados a saquear os recursos do fundo e em que, banqueiros travestidos de economistas se associam, sem qualquer representatividade ou razão justificativa, para deliberar sobre o fim do FGTS e de outros fundos sociais é de importância vital que os trabalhadores permaneçam atentos para impedir a aviltação de seu principal direito, sob pena de nada existir para comemorar quando o Fundo completar cinqüenta anos.
(Artigo escrito especialmente para a Revista da Adocef nº 104, Out/2011)
Mauro Antônio Rocha. Advogado e editor do site www.cartilhadofgts.com.br.