segunda-feira, 2 de setembro de 2024

Lei nº 14.711/2023 - De marco legal da garantia a "texto encomendado e de escopo reduzido"


[*] Mauro Antônio Rocha

A partir de agora, além dos já tradicionais "pedante" e "pretensioso" o epíteto 'Marco Legal das Garantias" pode ser acrescido, também, dos adjetivos "presunçoso e enganoso".
E a Lei nº 14.711/2023 deixa de ser um "marco" para ser, apenas, "um texto encomendado, com escopo bastante reduzido".


Quando, em julho de 2022, publiquei no boletim Migalhas um artigo em que debochei do “pedante”_ e “pretensioso epíteto” de Marco Legal das Garantias, atribuído ao então PL 4.188/21 e da ausência de inovações relevantes que limitavam a proposta à reprodução de dispositivos que já integraram a lei 13.476/17 e de alterações legais “que replicam sugestões precedentes, requentadas e reiteradas de refinamento da alienação fiduciária de bem imóvel, provindas de diversas minutas tornadas públicas em meados do ano passado e urdidas nos corredores do Ministério da Economia e das entidades representativas do sistema financeiro”, passei a ser (ainda mais) criticado pelos especialistas patrocinados (alguns bons amigos, inclusive, deixaram de atender meus telefonemas e responder mensagens enviadas).

Um ano depois, o querido Dr. Flávio Rocha Pinto da Silva, nosso maior especialista em garantias da nova geração e um dos principais redatores do projeto de lei trouxe à luz importante artigo (As garantias reais no anteprojeto de reforma do Código Civil: lições do anteprojeto do grupo de estudos temático e do Marco Legal de Garantias”, Boletim Migalhas, de 28/08/2024) onde, em autocitação, afirma:

“Há algo de presunçoso, e mesmo enganoso, na sua denominação de “Marco Legal das Garantias”, apelido de origem política e não doutrinária. Um Marco Legal é algo que refunda um instituto ou uma área do direito, o que jamais foi a pretensão do projeto. Ao contrário, tratou-se de texto encomendado, cujo escopo era bastante reduzido.”

Nenhuma novidade ou surpresa. Causou-me espanto, entretanto, constatar que diversos respeitáveis juristas passaram esse tempo todo iludindo a mídia e conferindo valor em intermináveis entrevistas, palestras e artigos ao "texto encomendado e de escopo reduzido" aprovado, que permanece com suas principais matérias vagando como um espectro pelos corredores do Banco Central do Brasil, que não parece muito disposto a assumir a paternidade, nem a responsabilidade pelo feto malformado.

Acho que o mundo mudou.

Mauro Antônio Rocha
Advogado especializado em Direito Imobiliário, Notarial, Registral, Crédito e Garantia Imobiliárias.
Presidente da AD NOTARE – Academia Nacional de Direito Notarial e Registral.