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segunda-feira, 1 de outubro de 2018

Conferência Internacional da Latin American Real State Society - LARES/2018

Transcrição da palestra sobre "Aspectos jurídicos imobiliários: DISTRATOS proferida pelo Dr. Mauro Antônio Rocha na Sessão Plenária 3 da Conferência Internacional da Latin American Real State Society - LARES/2018, no Auditório Millenium, na sede do SECOVI (SP), no dia 28/09 p.p.

Bom dia a todos.
Cumprimento aos integrantes desta mesa.

1. A questão da resolução dos contratos de aquisição de unidade imobiliária é monitorada pelos setores jurídicos da CAIXA ECONÔMICA FEDERAL desde o final do ano de 2013, com um tanto de preocupação e muita atenção, através da participação em grupos de estudos e mesas de debates, bem como do acompanhamento das proposições legais provindas dos Poderes Legislativo e Executivo, assim como das entidades representativas das incorporadoras, construtoras, dos adquirentes e consumidores. É fato que algum nível de desistência de adquirentes de unidades imobiliárias em construção – ainda que firmados sob cláusulas de irretratabilidade e irrevogabilidade - sempre existiu e pode ser considerada normal, face às características de um contrato de médio prazo e desembolsos constantes e pode ser admitido e acomodado pelas incorporadoras e construtoras, bem como pelo Poder Judiciário, desde que contida em percentual ou montante não prejudicial à consecução dos empreendimentos. Ainda assim, já naqueles momentos, o desfazimento do negócio não se mostrava amigável e consensual com relação à devolução dos valores pagos pelos adquirentes durante a vigência contratual.

2. Evidentemente, não se pode comparar a situação descrita, de desistência esperada e controlada, com a situação enfrentada a partir do primeiro semestre de 2014, em que a pretensão de resolução contratual manifestada pelos adquirentes disparou percentualmente, atingindo níveis absurdamente altos, tendo chegado quase à metade dos contratos firmados. A partir de então – para além da ausência de motivação aceitável e de se mostrar fundada exclusivamente no desencanto dos adquirentes com relação à perspectiva de lucro imaginada quando da contratação – essa despropositada demanda passou a ser acompanhada da exigência de devolução integral – imediata e atualizada – dos pagamentos efetuados, obrigando as sociedades credoras a repelir a possibilidade de resolução amigável e a impelir os descontentes à busca de solução judicial das demandas.

3. Dessa forma, a disputa foi direcionada ao Poder Judiciário nos mesmos termos em que estava sendo travada anteriormente – isto é, com vistas APENAS à determinação do quantum de retenção possível pelas incorporadoras e de prazo razoável para a devolução dos valores, resultando em decisões heterogêneas e disparatadas que fixaram retenções que oscilavam entre 5% a 30% e ordenaram reembolsos à vista, em prazos limitados ou, em alguns casos, no mesmo número de parcelas do recebimento. Parece ter faltado – e não vai aqui nenhuma crítica aos colegas que trabalharam nessas ações – a elaboração de uma tese jurídica, fundada na responsabilidade civil objetiva, que vinculasse os adquirentes de forma mais consistente ao próprio projeto de negócio.

4. De fato, a aquisição de uma unidade imobiliária em empreendimento em construção não pode ser resumida a um mero contrato de venda e compra. O adquirente, nestas condições, adere, de forma irrevogável e irretratável, a um negócio de interesse coletivo cuja consecução não poderá prescindir das contribuições financeiras contratadas. Sua desistência, portanto, implicará na impossibilidade de conclusão do empreendimento, no atraso do cronograma de obras, ou, no mínimo, na necessidade de esforços redobrados dos demais participantes e resultará, em qualquer desses casos, em perdas e danos, pelas quais deveria responder o adquirente desistente. Mal comparando – e já me desculpando pela comparação – é como se um pai desistisse da paternidade durante a gestação da criança. É evidente que – dotado de livre arbítrio – ele poderá abandonar os planos de casamento, de constituição de família etc., mas a gestação prosseguirá, independentemente de sua vontade, assim como suas responsabilidades com relação à criança e delas o pai desistente haverá de dar conta, espontaneamente ou por força de determinação judicial.

5. Porém, ainda que o momento mais tenso já tenha passado, há um enorme estoque de ações em andamento, aguardando sentença e faz-se necessário regrar essa situação para que não mais se repita a crise dos “distratos”. Para tanto, vários projetos de lei se destacam pela fase adiantada de avaliação no Congresso Nacional, como se destaca também o chamado “Pacto Global” firmado no Rio de Janeiro, mas ainda não aprovado pelas entidades representativas interessadas. Nenhum deles parece, no entanto, resolver de forma institucional e definitiva a questão discutida. São pálidos ao sugerir que o retorno do imóvel ao estoque do incorporador seja suficiente ao equilíbrio das contas, desconsiderando que a negociação desse imóvel exigirá novos esforços de divulgação, venda e contratação, não sendo lícito pretender a compensação de eventual lucro obtido nesse novo negócio com os resultados decorrentes da transação originária.

6. Para tanto, é preciso que se negociem normas que estabeleçam o justo equilíbrio entre o direito e a necessidade do adquirente a desistir do negócio jurídico e a recuperar parte dos valores pagos, MAS que reconheçam o direito do incorporador a (i) impor penalizações ao comprador que adere à incorporação, inclusive com a retenção da parte dos valores pagos correspondentes às despesas não recuperáveis e aos prejuízos causados pela desistência; (II) que permita que a devolução do devido se efetue em prazos compatíveis com o fluxo de caixa do empreendimento e (III) que também reconheça que a pretensão de lucro do incorporador integra o contrato originário e não pode ser desprezada, reduzida ou substituída por eventual resultado positivo obtido em novo negócio ajustado para a alienação do imóvel retornado.

É o que tinha a dizer, agradeço a atenção.

Obrigado.